Rui Horta regressa à dança
Rui Horta | Vespa | foto: © Paulo Pacheco |
«Não quero que este
espectáculo seja visto como uma autobiografia, mas sim como uma performance que
pode ser interpretada, em aberto, por outro intérprete qualquer» confessou, no
final, ao público que enchia a plateia da Blackbox durante a partilha de ideias
entre todos os presentes.
VESPA tem, como insecto e
como obra, metamorfoses do corpo e do som. Começa pelo zumbido que enche a
cabeça do performer, do homem que se reveste de uma carapaça, ou exo-esqueleto,
que vai explorando num jogo de (re)criação de novas potenciais formas do corpo.
Há máscaras e revelações, do rosto e da memória. Há pessoas que entram como
fantasmas, o arquitecto Óscar Niemeyer é um deles, outros serão os pescadores
de Portimão que emblematicamente anunciam uma ferroada que Rui quer dar sobre
questões ambientais. As suas palavras são fortes como o ferrão da VESPA que
ecoa sobre a textura do baixo eléctrico que toca Bach. As próteses não serão
suficientes para disfarçar igualmente os gestos fortes do bailarino, que leva o
seu corpo ao limite dos seus sessenta anos.
Tudo
muda, por vezes senti estar a ver à minha frente as visões que tive quando li
“A Metamorfose” de Franz Kafka nas suas descrições da personagem mutante Gregor Samsa. Livro escrito em 1915… agora estamos em 2017 e
nada muda. Parece um paradoxo, tudo e nada muda… como um zumbido irritante que
nos torna parte impotente de uma certa realidade que nos ultrapassa e na qual
queremos, e devemos, actuar.
Funciona muito bem este Rui Horta bailarino,
que traz a maturidade do coreógrafo, do homem, para o centro do palco. Podemos estar
a assistir à última das suas danças, porque se há um acidente, é como na
fórmula 1: «o espectador que vai ver esta “corrida” também pode contar ver um
acidente», afirma… mas esperemos que tal não suceda!
Como público sedento, queremos sempre surpreendentes
“encores”…
Manuel Casa Branca
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